Purpura fulminans é uma condição rara, mas ameaçadora à vida que pode estar associada a causas primárias ou secundárias. Entre as causas secundárias, infecção bacteriana é a principal. Relatamos o caso de purpura fulminans relacionada à infecção de corrente sanguínea por Escherichia coli.
RelatoMulher de 40 anos, com infecção pelo vírus HIV, em uso regular de TARV (TDF + 3TC + DTG), internada devido à desidratação por diarreia. Estava em investigação para colite microscópica. À admissão hospitalar na enfermaria, foi submetida à punção venosa profunda em veia femoral direita para hidratação. Após 48h, desenvolveu hipotermia, neutropenia e sinais de flebite em local de punção de acesso. O acesso foi trocado, foram coletadas hemoculturas e antibioticoterapia com meropenem e vancomicina foi iniciada. Evoluiu rapidamente para choque séptico e foi transferida para a UTI, sendo intubada e necessitando de aminas vasoativas em doses elevadas. Cerca de oito horas após admissão na UTI, passou a apresentar lesões cutâneas difusas violáceas desde o sítio de punção em veia femoral direita até região inferior do abdome e parte superior da perna direita até joelho. Exames laboratoriais após 48h mostravam leucocitose e CPK = 11.417 UI/L. Ambas as pernas da paciente se tornaram cianóticas e as extremidades, necróticas. Simultaneamente, a paciente desenvolveu coagulação intravascular disseminada (plaquetas = 7.000 células/mm³; PTT = 2,07; fibrinogênio = 436 mg/dL). Terapia transfusional com plasma fresco congelado e plaquetas foi iniciado. Os níveis de proteína C e de antitrombina III eram 67% e 103%, respectivamente. As hemoculturas foram positivas para E. coli multissensível e antibioticoterapia foi trocada para ceftriaxone. O quadro clínico apresentou melhora lenta progressiva, com retirada de aminas e as provas de coagulação normalizaram no dia 8, ainda com uso de plasma. Entretanto, no dia 11, após transfusão de plasma e crioprecipitado, apresentou TRALI e a terapia transfusional foi suspensa. No dia seguinte, as lesões cutâneas pioraram e a paciente foi submetida a desbridamento cirúrgico no dia 17, evoluindo para novo choque séptico e óbito no dia 19 de internação.
ConclusãoO caso apresentado demonstra uma infecção por bactéria multissensível com evolução para purpura fulminans (PF) que, mesmo com tratamento adequado, evoluiu para óbito. Alto nível de suspeição e tratamento precoce da causa de base são essenciais para o manejo dessa condição.